terça-feira, 31 de março de 2015

Anotações - Fernando Pessoa e a Determinação

Há um poema do Fernando Pessoa sobre o qual dizemos dois versos, que já se tornaram icônicos ("Valeu a pena? / Tudo vale a pena se a alma não é pequena..."). Penso que seria interessante darmos uma olhada no poema inteiro - ele é curto, veja abaixo. Na minha opinião, em relação aos temas aqui apresentados, sobre evolução pessoal e desenvolvimento humano, seus versos são pertinentes à reflexão sobre a determinação e a busca de evolução pessoal.
Nesse processo de crescimento - intelectual, profissional, social etc - havemos de sacrificar algo, o que vai nos exigir bastante coragem nos caminhos que surgirem. No poema, que retrata as aventuras dos portugueses antigos em relação às conquistas que se deram pelo mar, temos ali simbolizada essa questão de sacrifício e de coragem. Vejam, lá, que há uma referência - que se repete na primeira estrofe - a algumas perdas em nome das conquistas: o sal do mar são as lágrimas choradas, sobretudo das mães que se despediam de seus filhos; orações em vão representaram as perdas; e noivas perderam seus maridos. A ideia de conquista fica bem objetiva - tudo isso aconteceu para que fosse possível apropriar-se das fronteiras que o mar lhes possibilitava.
E vem a pergunta nos versos que bem conhecemos. Se temos dúvida sobre se valeu a pena tamanho sacrifício, a resposta está na dimensão do que queremos alcançar - se minha alma é pequena, não alcanço a dimensão positiva do que se pretende. Mas não basta ter a alma grande, é preciso entender que vai haver uma certa dose de sacrifício. Os navegantes antigos sabiam bem do temor que o Cabo do Bojador lhes despertava - passar por ele exigia muita disposição e coragem para enfrentar os monstros que se imaginava habitarem por ali. Para atravessar o Cabo, era preciso, primeiro, passar para além de suas dores e seus temores. O que exigia muita determinação. Determinação e um senso de o que se descortinaria era a amplidão semelhante ao reflexo do céu nas águas do mar. Guardadas as proporções de o que enfrentaram os navegantes de tempos antigos, é a mesma imagem de quando buscamos nos desenvolver!



MAR PORTUGUEZ

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram.
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa, Mensagem.

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